A contra-revolução portuguesa de 2015

Sebastião Reis Bugalho | ionline 2015.12.31


António Costa não é revolucionário nenhum porque não vai trazer nada de novo; a Troika não é novidade em Portugal. O verdadeiro revolucionário foi Pedro Passos Coelho.

A proximidade temporal da nossa República ao Estado Novo faz com que esta tenha um pendor mais à esquerda. O sistema eleitoral parece parado no tempo, causando constante turbulência governativa. A parcialidade da Constituição é gritante. A etimologia dos partidos políticos mostra isto mesmo. A direita tem que se disfarçar de centro-católica. Os conservadores chamam-se democratas-cristãos, os liberais chamam-se sociais-democratas e os sociais-democratas chamam-se socialistas. O facto de apenas o Partido Comunista coincidir com o seu nome prova o ponto. A bússola ideológica está atrasada e desequilibrada. Este fenómeno não é exatamente saudável para a Democracia, nem abona a favor do pluralismo.
Vários progressistas torceram o nariz quando escrevi que defender acerrimamente o Estado-Social se tinha tornado algo reacionário; ou seja, que os programas de partidos socialistas eram símbolo de revanchismo económico (em utopia) ou de populismo eleitoralista (em demagogia) devido à sua instabilidade despesista. Em 2011, alguém no PSD viu uma porta aberta para resolver o problema.
Por natureza, as revoluções têm um momento simbólico de reivindicação, em que a ordem é questionada para se vir a remodelá-la. O chumbar do PEC4 foi a Boston Tea Party do PSD. No século XVIII, os colonos americanos puseram Londres em causa. Em 2011, Passos ignorou os apelos de Durão Barroso e Angela Merkel. A vinda da Troika justificava as privatizações e os cortes brutais na despesa do Estado. A austeridade servia de álibi para a thatcherização do Partido Social-Democrata. A crise mundial e a má gestão do PS eram a razão perfeita para trazer a direita demo-liberal para o país. Tentava-se, pelo mal menor, equilibrar a balança. E se ser liberal é algo radical, um socialista é o quê? Terrorista? Poupemo-nos.
Não é por acaso que a velha guarda odiou o governo de Passos e Portas. A dupla fez-lhes a vida num inferno, noutros tempos. Pedro, na jota, quando era progressista a mais para Cavaco. Paulo, no Independente, quando Cavaco era progressista a mais para este. Chegado ao poder, Passos Coelho seguiu O Príncipe à letra. De avarento a responsável, ganhou a confiança popular que lhe permitiu ser o primeiro governo europeu a vencer eleições após um programa de ajuda externa e a primeira coligação a cumprir uma legislatura em Portugal. O Tribunal Constitucional e a própria Troika impossibilitaram uma liberalização mais conseguida. Pela tal marca ideológica na Constituição e porque o memorando não obrigava apenas a cortes, mas também a um aumento de impostos nada liberal. 
Esta revolução do PSD tinha, assim, tudo para correr mal. O referido sistema eleitoral tornou a reeleição da nova direita numa crise governativa. Contudo, a reação de António Costa aos resultados das legislativas consagra o feito de Passos Coelho. O único modo de o Partido Socialista impedir a direita de governar foi desrespeitar a sua identidade partidária e a decisão do eleitor, unindo-se à extrema-esquerda.
Outubro de 2015 representa o fim do grande fetiche político lusitano: o centro. 
À revolução discreta e conservadora de Passos Coelho, Costa respondeu com uma contra-revolução, com a ruptura para furar a reforma, com uma aliança reacionária condenada ao desacordo. Portugal pode gabar-se de um 25 de Abril sem terrores e sem guerra civil. Estou certo que Passos também estará orgulhoso da sua revolução. Para o bem e para o mal, ambas marcaram a nossa História.

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